Soja, milho e carnes brasileiras podem ganhar mercado com nova rodada de tensões entre EUA e China
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Soja pode ser o principal produto brasileiro beneficiado por uma guerra comercial entre EUA e China — Foto: Divulgação. |
Os Estados Unidos iniciaram, neste sábado (1º), a aplicação de tarifas de 10% sobre importações da China, cumprindo uma das principais promessas de campanha do presidente Donald Trump. A decisão reacende a guerra comercial entre as duas maiores economias do mundo e pode abrir oportunidades para o Brasil, especialmente nos setores de grãos e carnes.
A taxação imposta por Trump faz parte de uma política protecionista que busca reduzir a dependência dos EUA de produtos chineses. Embora durante a campanha o republicano tenha prometido tarifas de até 60% sobre importações da China, a alíquota final foi menor. Além da China, produtos do Canadá e do México também foram alvo da nova medida, sendo taxados em 25%.
Brasil pode aumentar exportações de soja para a China
O setor agrícola brasileiro pode ser um dos grandes beneficiados pela nova rodada de tensões entre os EUA e a China. Durante o primeiro mandato de Trump (2017-2021), o Brasil aumentou significativamente suas exportações de soja para o mercado chinês. Isso ocorreu porque, em resposta às barreiras tarifárias impostas pelos EUA, a China aplicou uma tarifa de 25% sobre a soja americana, redirecionando suas compras para outros países, especialmente o Brasil.
Atualmente, o Brasil é o maior exportador global de soja e o principal fornecedor do grão para a China. O país asiático utiliza a soja principalmente para alimentar seu rebanho de suínos, o maior do mundo. Com as novas tarifas impostas por Trump, a tendência é que a China busque fortalecer ainda mais sua relação comercial com o Brasil.
Segundo um relatório da consultoria StoneX, divulgado após a reeleição de Trump em novembro passado, o Brasil tem um histórico de se beneficiar dessas disputas comerciais. A expectativa é que, caso a guerra tarifária entre EUA e China se intensifique, o Brasil possa consolidar ainda mais sua posição como principal fornecedor de soja para o mercado chinês.
Exportações de milho e carne também podem crescer
Além da soja, outros produtos agrícolas brasileiros podem se beneficiar. O milho, que já teve um crescimento expressivo nas exportações nos últimos anos, pode conquistar ainda mais espaço na China. Em 2023, o Brasil chegou a ultrapassar os EUA como maior exportador mundial do cereal, e uma nova barreira tarifária contra produtos americanos pode reforçar essa tendência.
O setor de carnes também pode ganhar com a disputa. A China é um dos maiores importadores globais de proteína animal, e os EUA são um dos principais concorrentes do Brasil nesse mercado. Atualmente, o Brasil lidera as exportações mundiais de frango e carne bovina, enquanto os EUA são o segundo maior exportador de frango e o quinto de carne bovina. No segmento de carne suína, os EUA ocupam a liderança global, e o Brasil aparece na terceira posição.
Fernando Henrique Iglesias, analista da consultoria Safras & Mercado, destacou que os EUA são concorrentes diretos do Brasil na exportação de carnes e que eventuais restrições às vendas americanas para a China poderiam abrir novas oportunidades para os frigoríficos brasileiros.
Brasil pode ser alvo de tarifas nos EUA?
Apesar dos possíveis ganhos com as exportações para a China, há um risco para o Brasil: Trump já deu sinais de que pode impor tarifas sobre produtos brasileiros. Em dezembro, o republicano afirmou que o Brasil cobra preços elevados por seus produtos e indicou que poderia adotar uma política de “reciprocidade”.
“Nós vamos tratar as pessoas de forma muito justa, mas a palavra 'recíproco' é importante, porque se alguém nos cobra... Se a Índia nos cobrar 100% e nós não cobrarmos nada pela mesma coisa... Eles mandam uma bicicleta para nós, nós mandamos uma bicicleta para eles, eles nos cobram 100, 200. A Índia cobra muito, o Brasil cobra muito. Se eles querem nos cobrar, tudo bem, mas vamos cobrar a mesma coisa”, afirmou Trump.
No dia de sua posse, em 20 de janeiro, o republicano reforçou esse discurso e declarou que “o Brasil precisa dos EUA mais do que os EUA precisam do Brasil”.
Diante dessas declarações, o presidente Lula já adiantou que, caso os EUA imponham tarifas sobre produtos brasileiros, o governo brasileiro adotará medidas de reciprocidade, taxando mercadorias americanas.
Atualmente, os Estados Unidos são um importante destino para produtos agrícolas brasileiros. O país é o maior comprador do café brasileiro e um dos principais mercados para suco de laranja, carne bovina, produtos da cana-de-açúcar, couro e soja.
Fernando Henrique Iglesias, da consultoria Safras & Mercado, avalia que, apesar do tom protecionista de Trump, a imposição de tarifas sobre produtos agrícolas brasileiros pode ser pouco provável. Isso porque os EUA dependem de algumas commodities brasileiras, como carne bovina. “Hoje, por exemplo, os Estados Unidos são o segundo grande comprador de carne bovina do Brasil. Eles estão na pior posição do seu rebanho bovino desde os anos 50. Então, eles não têm muito como abrir mão do Brasil neste momento”, explica.
Além disso, o impacto de tarifas sobre produtos agrícolas pode pressionar os preços dos alimentos nos EUA, algo que qualquer governo busca evitar. A consultoria StoneX lembra que, durante o primeiro mandato de Trump, ele não impôs tarifas sobre commodities agrícolas brasileiras, mas adotou medidas contra produtos industrializados, como o aço, que foi taxado em 2019.
O que pode acontecer com o Brasil?
A nova guerra comercial entre EUA e China pode criar oportunidades para o agronegócio brasileiro, principalmente nos setores de soja, milho e carnes. A experiência do primeiro mandato de Trump mostra que tensões entre os dois países podem levar a um aumento das exportações brasileiras para o mercado chinês.
Por outro lado, a possibilidade de que o Brasil também se torne alvo de tarifas nos EUA gera incertezas. O posicionamento de Trump indica que ele pode buscar impor barreiras comerciais ao Brasil, o que pode afetar setores estratégicos para a economia nacional.
Diante desse cenário, o Brasil precisará equilibrar sua relação com as duas potências e acompanhar de perto os desdobramentos da política comercial americana nos próximos meses.
Fonte: G1